Conhecemos de perto o espaço de criação da designer Bianca Barbato. Fizemos uma visita à sua casa-atelier em São Paulo, onde ela nos contou um pouco sobre os 10 anos da sua trajetória como designer. Leia a entrevista completa.
“Formas nostálgicas e acolhedoras” é a definição que você usa para as suas peças. As Influências retrô-vintage estão por todo lado, desde a arquitetura intacta do seu apartamento até o estilo dos seus produtos. Conte mais sobre esse conceito.
Minhas influências e inspirações principais vem da curiosidade em como se faziam as coisas antigamente. Desenho objetos que remexem algumas memórias afetivas, resgatam lembranças ou instintos. Por isso tem este poder de nostalgia e acolhimento, e talvez daí venha a sua interpretação de uma estética de outras épocas. Vejo minhas peças mais com contemporaneidade sobre uma nova interpretação do antigo porque resgato materiais e modos de fazer adaptando-os para o hoje, além da influência “retrô-vintage”.
Como é a sua rotina e o seu processo criativo?
Não sigo exatamente uma regra ou rotina, mas o comprometimento com o objeto não deixa de ser uma regra que só se dá com disciplina, persistência e flexibilidade. É durante as pesquisas dos métodos de fabricação que surgem as descobertas do que o croqui vai virar de fato, de onde vem o entendimento sobre as possibilidades e limitações do processo construtivo, e de onde vem o saber de como cada material se comporta durante o trajeto da ideia. Aprendo com a prática dos erros e acertos, com a mão na massa, visitando as fábricas e artesões, observando e respeitando o modo deles fazerem.
A revêrencia à cultura brasileira é muito presente no seu trabalho, desde a escolha do título à inspiração para coleções completas, como na Linha Renda, com desenhos inspirados nas rendas Bilro e ponto-cruz. Como é o processo de transpor influências artesanais para o processo industrial com os parceiros/fabricantes?
Geralmente os materiais e técnicas são os meus protagonistas e ponto de partida. Estou sempre testando o limite dos parceiros apresentando projetos de fabricações mais complexas e ousadas, quase no limite do que eles são capazes de fazer. Com os materiais que sinto afinidade, busco também explorar as tridimensionalidades, geometrias, texturas, sombras, reflexos… São muitas as tecnologias existentes hoje em dia e elas estão cada vez mais acessíveis a todos, mas, ao mesmo tempo, tem o seu lado negativo também. O avanço tecnológico extermina algumas profissões com a mesma velocidade que cria as novas. Esta mecanização me faz refletir no modo de pensar meus objetos e sobre o que busco explorar dentro destas qualidades que me identifico, sendo algumas que sustento, quase extintas infelizmente.
A maioria das peças tem elaborações bastante complexas, então acabo desenvolvendo minhas próprias técnicas e caminhos. Mesmo utilizando métodos como suportes industriais, eles são só a ponte para simplificar minha produção junto ao artesão. Priorizo trabalhar com parceiros que tem tradição em ofícios artesanais, que são fiéis em produzir à moda antiga, adequando sempre a minha criação ao modo deles fazerem. Centralizo boa parte da produção porque gosto deste processo de construção, aprendo e me inspiro com esta vivência.
Quais são os seus 3 trabalhos favoritos? Fale sobre a história e o processo criativo de cada um desses trabalhos.
Não consigo pensar em 3 favoritos porque cada um tem uma história própria e processo, mas exemplifico aqui 3 processos: No caso da linha Tramas o fator inicial foi a marchetaria com metais: primeiro comprei as chapas metálicas e cortei no laser. Fiquei um bom tempo montando quebra-cabeças com peças geométricas e executei alguns protótipos que deram errado. O projeto só vingou quando procurei, por indicação, um senhor artesão peculiar que só trabalhava com latão e fazia a solda de prata com a mesma delicadeza e método de quem faz jóias. Daí fui me aprimorando com os metais e parceiros de forma harmoniosa e muitos projetos com metais surgiram. A linha Renda, de “aço rendado”, é a mais industrial delas: feita de aço carbono, que é extremamente rígido, e inspirada na estética dos pontos quadriculados e uniformes dos bordados em tecido, que são extremamente delicados. Adequei minha ideia aos quadrados e medidas espaçadas no padrão da puncionadeira que perfura o metal. Utilizei a indústria, que hoje em dia corta e dobra o metal rígido, como se fosse papel, baseada numa das formas de bordado delicado, das mais antigas do mundo, feitas em tecido.
Você é plural, trabalha com diversos materiais, técnicas e tecnologias. Como funciona a sua dinâmica de processo de pesquisa e constante experimentação por novos projetos?
O meu desafio é experimentar materiais, então estou sempre explorando as possibilidades e aprimorando com eles. Às vezes dá certo, às vezes não, faz parte esta adequação. Tem peças que desenho em mármore, mas posso adequar para vidro, madeira, metal, resina ou transformar em outra coisa. Entre tornos, repuxos, cortes à laser, moldes, calandra ou totalmente artesanal… não me limito muito porque estou sempre buscando vários métodos e caminhos para as minhas ideias, sou bem flexível com isso.
Quais foram os momentos mais marcantes da sua carreira até agora?
No ano que vem, fará 10 anos que comecei a desenhar e comercializar minhas peças, mas foi 2015 o ano da expansão do trabalho, após quase 1 ano de imersão criativa me dedicando só a isso, desenvolvendo protótipos e testando novos meios e novos materiais.
Uma dica que você gostaria de ter dado para a Bianca Barbato bem no início da carreira.
Faça tudo igual, com menos ansiedade, porque no final dá sempre certo, mesmo quando dá errado. O erro é uma forma de dar certo também.
A melhor e pior parte de ser um designer?
Tirar uma ideia da cabeça para o papel, do papel para o computador, e, no computador, o processo de esmiuçar cada milímetro de um objeto é a parte boa e ruim ao mesmo tempo. A parte boa é a materialização da ideia, quando o processo já deu certo e os fornecedores já entenderam a proposta e a produção flui com facilidade. Ruim é o período que antecede, os erros, mas na maioria das vezes, o erro pode resultar num acerto muito melhor. Ruim é também trabalhar com pessoas que não entendem a complexibilidade das peças, que lidam com o meu trabalho como se eu fosse uma indústria, sendo que é totalmente o oposto. Lido com modos artesanais e complexos, e isso requer tempo e compreensão de todas as partes. Do início ao fim. É das melhores coisas também, ver que ao longo de quase 10 anos de desenvolvimento de criações autorais, com know-how em diversos materiais, de forma totalmente autodidata, não ter limite ou rótulo para questões de contexto puramente comerciais.
Projetos futuros?
Pensando na coleção que lançarei em agosto na MADE.
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