Design que toca ao coração
A forma segue a função’ diz a máxima do design moderno em vigor no século 20. Esse pensamento funcionalista, que foi despindo os objetos, mudou ao longo das décadas e a emoção conquistou seu espaço junto aos criadores. O francês Philippe Starck e o alemão Ingo Maurer são dois exemplos de estrelados designers que adotam essa prática em seus trabalhos. Por aqui, o design que encanta aos olhos e aguça a memória afetiva se faz cada vez mais presente como mostrou a São Paulo Design Weekend, realizada em agosto. Veja abaixo alguns desses exemplos.
Retrato de família
A coleção Imigrante, idealizada pela designer Nicole Tomazi, homenageia seus antepassados. De vime, as peças são fabricadas por artesãos da cidade de Ipê, na serra gaúcha. “Escolhi a matéria-prima para valorizar esse trabalho manual que está se extinguindo. Os italianos que chegaram ao Rio Grande do Sul transformaram o território por meio da manualidade, se apropriando de materiais locais para confeccionar instrumentos e objetos utilitários”, diz Nicole. “É esse hibridismo de culturas que gera o novo, é a nossa riqueza”, afirma. A linha contempla cestos, fruteiras e bandejas.

Viagem no tempo
Usados em séculos passados para transportar bagagens durante longas viagens marítimas, os baús resgatam uma antiga tradição. Hoje organizam de roupas a documentos e muitas vezes servem de apoio lateral para poltronas e sofás. Na versão do designer Ricardo Graham Ferreira, de oEbanista, a peça foi inserida no aparador Onda, feito de madeira maciça e couro vegetal. Com 47 cm de altura, o tampo do móvel também pode servir de assento.

Dobraduras de metal
Surgido há quase mil anos na corte imperial japonesa, o origami é celebrado até hoje e faz sucesso pelo mundo. O arquiteto paulista Jayme Bernardo, radicado em Curitiba, trouxe essa arte para sua coleção de móveis para a Dieedro e lançou a mesa de jantar Tsuru, na qual a base remete à dobradura de papel do pássaro da sorte.

Jardins inesperados
A tão desejada natureza, fonte de vida e inspiração, vira ponto de atração na linha Life, de Tiago Curioni, cujas superfícies de chapa de aço são revestidas com placas de líquens provenientes das florestas dos países do norte europeu. A produção ocorre em parceria com a empresa italiana Benetti Moss, que beneficia o material na Itália, deixando-o em estado de hibernação para não demandar manutenção nem regas, pois o vegetal retira os nutrientes do ambiente no qual está inserido. Na feira Made, sediada este ano no Pavilhão da Bienal, no Parque do Ibirapuera, Tiago lançou duas peças: a mesa lateral com tampo recoberto de musgo avermelhado e o pendente Roof.

Curvas apaixonantes
A poltrona Surf, do Lattoog, remete ao esporte que tem adeptos em todo o país: o surfe. Na primeira versão, o assento e o encosto foram feitos manualmente com poliuretano expandido – mesmo material e processo de fabricação das pranchas. No lançamento na High Design para a Empório das Cadeiras, a poltrona ganhou molas instaladas no assento para remeter ao movimento das ondas do mar. Outro produto dos cariocas Leo Lattavo e Pedro Moog que recupera um clássico do design é a poltrona giratória Basket, fabricada pela Schuster. A inspiração da forma veio das poltronas Bergére. Quem já não teve em casa uma dessas? Na pesquisa da dupla, a técnica de torção de ripas de madeira foi a matriz para o desenvolvimento de todo o projeto.


Tradição renovada
Presente corriqueiro nas festas de casamento, os conjuntos de chá costumam passar de mãe para filha. A bebida também é cultuada em várias partes do mundo e, no Japão, tem até cerimônia dedicada a ela. A mesa Louça do brasiliense Humberto da Mata remete a essas histórias e propõe um novo uso para os utensílios domésticos.

Do tempo da vovó
Eterno objeto de desejo do universo feminino, a penteadeira Nena se destacou na coleção de móveis apresentada por Mariana Betting e Roberto Hercowitz, dupla do Em2, na feira High Design. Composto de espelho circular iluminado com fitas de LED, o móvel dispõe de gavetas com divisórias para acomodar bijus e itens de beleza. Nas laterais, mais duas gavetas reservam área para produtos de maquiagem. “Assim não há necessidade de se afastar a cadeira enquanto se maquia”, explica Mariana. A estrutura de madeira se combina ao couro, revestindo tampo, os interiores das gavetas e os puxadores. O móvel acaba de ser selecionado entre os finalistas do Prêmio Design do Museu da Casa Brasileira 2017.

Da mesa para o MoMA
Na exposição do D&D Shopping, os móveis clássicos do design internacional que já pertenceram ao Museu de Arte Moderna de Nova York (MoMA) e hoje fazem parte do acervo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) dominaram o térreo do complexo comercial. Entre eles, estavam dois produtos brasileiros: a poltrona Mole, do carioca Sergio Rodrigues, e os talheres Camping, dos gaúchos José Carlos Bornancini e Nelson Ivan Petzold, de 1973. O conjunto, no qual a faca serve de estojo para o garfo e a colher, permaneceu muitos anos no catálogo do Bom Desenho do museu nova-iorquino. Não é esse porém o talher mais famoso da dupla de designers: o Comer Brincando, com carinhas de príncipe, princesa e cachorro, virou ícone da geração que foi criança nos anos 1970 e 80. Também presentes na mostra do shopping center, eles arrancaram suspiros dos visitantes.

Fanáticos por rodas
Que carro desperta incontidas admirações já se sabe, mas foi surpreendente descobrir que um automóvel brasileiro conquistou tantos fãs ao longo das décadas. O MP Lafer, desenhado nos anos 1970 pelo arquiteto paulista Percival Lafer, também criador de móveis emblemáticos do design brasileiro, brilhou no estacionamento da Teo. A loja de mobiliário vintage sediou uma exposição em torno da produção de Lafer nos anos 1960 e 70, com curadoria do arquiteto Felipe Hess. Na tarde de bate-papo com o designer, dezenas de pessoas compareceram para ouvir as histórias do renomado profissional. Entre eles, estava Ignácio de Loyola Brandão, vizinho da loja e que foi ao local atraído pelo carro. O evento rendeu até uma crônica do escritor publicada no jornal O Estado de S. Paulo. “A memória afetiva disparou. Há anos não via um MP Lafer, sonho impossível ao meu bolso”, escreveu Ignácio.


Por Regina Galvão
Visite a loja de alguns designers da matéria presentes na Boobam: